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Sobre a articulação política do vice-presidente

Em nosso artigo mais recente, abordamos as características principais dos últimos vice-presidentes brasileiros. Agora, falaremos da articulação política do número dois da República e dos riscos embutidos para o titular do Planalto.

Tomemos como exemplo o atual vice, general Hamilton Mourão. Ao longo dos quase três anos de mandato e sofrendo ataques constantes do presidente Jair Bolsonaro (PL) e seu grupo político, ele manteve uma postura discreta, evitando confrontos. Mais ainda, mesmo nos momentos de crise mais aguda no governo, como a prisão do ex-assessor Fabrício Queiroz, Mourão jamais pleiteou a cadeira presidencial. Talvez o espírito militar, de respeito à hierarquia, explique tal comportamento.

Para um eventual segundo mandato, Bolsonaro tem duas opções. Um outro militar, como o general Braga Netto, ora cogitado, representaria a aposta do presidente em uma espécie de continuidade do “estilo Mourão”, com riscos controlados para o mandatário. Já um político do Centrão - algo entre o PP e o Republicanos - traz um novo elemento. Em caso de alguma crise ou evento mais grave, a possibilidade de desembarque é maior, e não surpreenderia a mobilização pelo afastamento do titular do Planalto, a partir do vice.

No caso de Lula e do PT, o histórico recente deixa o partido em alerta. Os petistas sofreram uma espécie de “ataque especulativo” do aliado MDB (então PMDB) durante a gestão Dilma, ataque esse alimentado em parte pelo comportamento da presidente, pouco afeita às negociações políticas. Pior, o vice à época, Michel Temer, era uma liderança nacional da legenda e teve força para, de alguma maneira, se articular e trabalhar a favor do afastamento da titular do cargo. Cabe ressaltar que a indicação de Temer, ainda na campanha eleitoral do primeiro mandato, foi uma imposição dos emedebistas.

Hoje, a pré-candidatura de Lula está debruçada sobre a definição do número dois. Geraldo Alckmin ou Rodrigo Pacheco, discretos, porém exímios negociadores, carregam consigo um potencial de risco. A baixa consistência programática de uma chapa com essa configuração pode gerar ruídos em algum momento de uma nova gestão petista. Um quadro que pode se tornar delicado.

O campo da chamada “terceira via” vive outra realidade. A dobradinha Moro/Dória pode se materializar, com risco controlado e o apoio de outras legendas no mesmo espectro programático-ideológico. A atuação do governador paulista, porém, precisaria ser monitorada. Seus embates dentro do PSDB mostram uma disposição extra pela conquista do poder, e a pouca experiência política do ex-ministro da Justiça representa uma fragilidade. Afinal, o impeachment de Dilma, com a ativa participação de seu vice, ainda se encontra vivo na memória recente dos postulantes à cadeira da Presidência.

Enfim, a escolha do vice-presidente representa uma etapa importante e delicada do processo sucessório.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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