Obstáculos no caminho da PEC dos Precatórios - Política - Hold

Obstáculos no caminho da PEC dos Precatórios

A aprovação do texto-base em primeiro turno no plenário da Câmara dos Deputados da PEC dos Precatórios não significa que ela será definitivamente aceita pelo Congresso Nacional. Ledo engano de quem aposta todas as fichas na proposição.

A matéria, na verdade, está longe de um consenso. O resultado do primeiro escrutínio, com 312 votos favoráveis, pouco mais que o mínimo necessário e depois de ameaças e promessas, mostra as dificuldades que o governo enfrentará ao longo do processo de discussão do texto.

Grosso modo, a PEC é essencial para o projeto político-eleitoral de Jair Bolsonaro (sem partido). Sem ela, o governo não terá recursos para colocar em pé o Auxílio Brasil, o Bolsa Familia “vitaminado”. Para o Planalto, a questão é crítica.

Aliás, necessário dizer que o governo troca um plano assistencial de mais de dezoito anos, com reconhecido valor econômico e social, que atende mais de 32 milhões de famílias por um “novo” auxílio, claramente eleitoral, temporário e que atenderá somente dezessete milhões de famílias. Ninguém ainda soube dizer o que vai ser desses beneficiários que não serão atendidos pelo “novo” Auxílio Brasil e se haverá um outro programa quando este for encerrado ao final de 2022. Perguntas ainda sem resposta.

Vejamos, então, alguns dos riscos presentes para a aprovação definitiva da PEC dos Precatórios:

“Efeito Ciro Gomes” no PDT - a decisão de Ciro Gomes de suspender a pré-candidatura presidencial devido ao posicionamento favorável do PDT à PEC dos Precatórios gerou de imediato uma crise na bancada. Mais que isso, ao menos parte dos quinze votos “sim” da legenda pode ser revertida no segundo turno, o que aumenta as incertezas em torno do destino da PEC. Dor de cabeça para o governo.

Partidos divididos - a rebelião no PDT parece ter se espalhado por outras agremiações. No PSB, dez votos favoráveis estão em xeque, outros dez no MDB e dois no Cidadania. Na ponta do lápis, a PEC dos Precatórios poderá receber menos de trezentos votos no segundo turno.

Condução de Lira - incomodou a muitos parlamentares a condução do processo de votação pelo presidente da Casa, Arthur Lira (PP/AL). Entre outras manobras, ele alterou o Regimento para permitir que deputados em viagem oficial (COP26) votassem a matéria. Igualmente o empenho de volume expressivo de recursos oriundos da emenda de relator (RP9) entrou no jogo. Mais que um magistrado, Lira mostrou-se importante operador em prol da PEC.

No Senado Federal - caso seja aprovada em dois turnos pelos deputados, a PEC deverá enfrentar resistência entre os senadores. A Casa vem mantendo uma posição dissonante em relação ao Planalto, conforme visto na CPI da Covid e na discussão de temas como as alterações nas regras do Imposto de Renda, Reforma Tributária e nomeações de autoridades. Em tese, ela terá de passar primeiramente pela Comissão de Constituição e Justiça, comandada por Davi Alcolumbre (DEM/AP), hoje desafeto de Bolsonaro. De saída, um risco para o governo.

Posição do mercado - apesar de considerar a PEC dos Precatórios um “calote”, o mercado avalia que sua rejeição obrigará o Planalto a adotar uma medida ainda mais drástica, como editar um decreto de calamidade pública que abriria precedente para mais descontrole das contas públicas. O efeito já foi sentido. A não aprovação dos destaques da PEC ainda nessa semana derrubou a bolsa e aumentou ainda mais o dólar. No frigir dos ovos, o setor financeiro não tem mais ilusões com relação à agenda liberal do governo.

Bolsonaro e seus mais íntimos apoiadores apostam todas as fichas nesse programa assistencial, algo para chamar de seu. O projeto de poder, as eleições e reeleições dependem, aos olhos desses personagens, apenas e tão somente da implementação desse “novo” programa. Se esquecem, no entanto, que metade dos beneficiários ficarão imediatamente desassistidos, que a economia está sem controle e que o efeito inflacionário é mais sentido justamente por essa parcela mais pobre da população.

Contar que o aumento do valor do benefício dos atuais R$ 180,00 para R$ 400,00 trará imediatamente milhões de votos para si e para os seus é, no mínimo, desconhecer o Brasil real.

André Pereira César
Cientista Político

Alvaro Maimoni
Consultor Jurídico

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