Governo Bolsonaro: o contínuo abandono dos aliados - Política - Hold

Governo Bolsonaro: o contínuo abandono dos aliados

Já abordada nesse espaço em outras ocasiões, uma característica específica do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) tem sido realçada nessas primeiras semanas de CPI da Covid. Fora do poder, ex-aliados do governo são descartados pelo titular do Planalto e seu entorno, ingressando em um ostracismo político e invariavelmente passam a ser atacados nas redes sociais pelos apoiadores do presidente. O jogo já é conhecido.

Apenas para relembrar, esse método foi colocado em prática logo no início do governo, ainda nos primeiros meses de 2019, com o afastamento do então secretário-geral da Presidência, Gustavo Bebianno, que se envolveu em atritos com filhos do presidente. Casos similares ocorreram desde então - Santos Cruz, Mandetta, Teich, Azevedo e Silva, Sérgio Moro, entre outros. Não importa o grau de fidelidade, o afastamento sempre se dá de maneira desgastante. O ex-aliado passa imediatamente à condição de pária.

A CPI da Covid marca uma nova etapa nesse procedimento. Dois depoentes, o ex-secretário de Comunicação, Fábio Wajngarten, e o ex-ministro das Relações Exteriores, Ernesto Araújo, sem qualquer tipo de apoio do Planalto, defenderam seus atos e posicionamentos ao longo da pandemia, quando estavam no governo. Mais ainda, ambos adotaram a estratégia de blindar o presidente Bolsonaro e jogaram toda a culpa pelo caos na saúde nas costas do ex-ministro Eduardo Pazuello, que ainda conta com o apoio do governo por ser general da ativa.

Esse último, por sua vez, mesmo blindado por um habeas corpus preventivo concedido pelo Supremo Tribunal Federal, adotou o ataque como defesa. Confrontando o colegiado, ele negou qualquer erro na condução da pandemia em sua gestão. Chegou a afirmar que a crise do oxigênio no Amazonas durou apenas três dias. Suas declarações, evidentemente, serviram mais para proteger o titular do Planalto do que se proteger. Essa defesa em prejuízo próprio chegou a ser alertada pelo presidente da CPI, senador Omar Aziz (PSD/AM).

Em suma, o desenrolar da CPI confirma a percepção de que personagens que habitaram ou orbitaram o governo em posições de destaque, e que hoje não fazem mais parte da estrutura, foram abandonados à própria sorte. Os senadores e a classe política como um todo já entenderam o funcionamento desse mecanismo. No caso da CPI, seus integrantes estão atacando, questionando sem se preocupar, pois sabem que não haverá ninguém para defendê-los.

Por outro lado, os membros da tropa de choque estão trabalhando, por ora, para proteção apenas e unicamente de Bolsonaro e sua família. No limite, é uma espécie de “cada um por si”.

Ao abandonar antigos aliados na CPI, o governo assume um risco. A qualquer momento, um depoente pode se sentir incomodado com a situação e mudar de posição - nesse caso, passando a atuar contra os interesses do Planalto. A situação não é confortável para o presidente Bolsonaro.

PS. as preocupações do governo não estão restritas à CPI. O caso dos R$ 3 bilhões das emendas do “tratoraço”, as denúncias da suposta “Abin paralela” conduzida pelo vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos/RJ) e a operação da Polícia Federal contra o ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, por suposto envolvimento com exportação ilegal de madeira, são outros focos de uma crise política que se avizinha. Há fortes rumores, inclusive, que parte do Centrão deverá desembarcar do governo nos próximos dias. Turbulência forte se desenha no horizonte.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

Comments are closed.