Lula tenta se mover - Política - Hold

Lula tenta se mover

Em três ocasiões no período pós-redemocratização, o Estado brasileiro foi desafiado a responder a eventos excepcionais. No segundo mandato de Fernando Henrique Cardoso (PSDB), no início dos anos 2000, a crise do apagão do setor elétrico afetou duramente a população de norte a sul do país. Depois, na pandemia, o governo de Jair Bolsonaro (PL) se negou a agir e só adquiriu vacinas após o governador paulista João Dória (PSDB) entrar em campo para atender a população de São Paulo. Agora, o governo federal se movimenta para, em parceria com os governos municipais e estadual do Rio Grande do Sul, trabalhar no socorro e recuperação do estado.

Cabe reconhecer aqui que, no caso do apagão, o então titular do Planalto e sua equipe priorizaram a ação, o que, no caso da Covid, não ocorreu. Agora, a atual gestão está desafiada a responder aos anseios e demandas postas à mesa.

Aos fatos. É do conhecimento geral que setores importantes do mundo político (oposição e mesmo alguns aliados), da imprensa, do empresariado e da sociedade civil, apesar da flagrante melhora de todos os índices sociais e econômicos, estão decepcionados com diversos aspectos da atual gestão. Os problemas na comunicação não são resolvidos a contento, o que tem irritado o próprio titular do Planalto.

A recente aproximação entre Lula (PT) e o governador do Rio Grande do Sul, Eduardo Leite (PSDB), foi um primeiro passo nesse sentido. Os dois há muito são adversários políticos, mas a realidade falou mais alto. Leite se rendeu aos fatos e se viu obrigado a correr para Brasília em busca de ajuda. Não havia alternativa. O propagado Estado mínimo de Leite não deu conta de suportar, sozinho, tamanha tragédia. A crise humanitária vivida pela população do Rio Grande do Sul por conta das tempestades comprova que somente a estrutura e a força do Estado é capaz de enfrentar eventos tão catastróficos, apesar de todos os esforços e ajuda dos milhares de voluntários.

A questão, porém, é muito mais complexa. Enquanto as águas não baixarem no estado, não se saberá o verdadeiro montante necessário para as obras de reconstrução. Qualquer estimativa, hoje, é mera especulação. Especialista em contas públicas, o economista e ex-secretário da Fazenda do estado de São Paulo, Felipe Salto, deu o tom. Segundo ele, a suspensão dos pagamentos da dívida gaúcha com a União por três anos não atingiria o coração da crise na região, sendo mero ajuste pontual. Nada mais.

Para piorar, enquanto o caos reina no estado, especialistas apresentam sugestões esdrúxulas. Por exemplo, implodir o aeroporto internacional Salgado Filho e construir um novo, possivelmente em outro local, ou pior, explodir a Lagoa dos Patos para que a água possa escoar mais rápido. Qual seria o custo da construção de um novo aeroporto para um estado com as contas já combalidas ou de um provável desastre ambiental na região da Lagoa dos Patos? Também há a questão das empresas. Nada menos que 90% delas, de todos os segmentos e portes, foram atingidas de alguma forma.

Voltando a Lula, ele aos poucos - bem aos poucos - vai se dando conta que a dinâmica da relação do Executivo com o Congresso Nacional mudou, e o jogo é muito mais difícil. Em determinados momentos o Planalto fica simplesmente refém do Centrão e outros. Nem a concessão de cargos no primeiro escalão do governo está conseguindo alterar essa realidade. Muito em decorrência do gigantesco apetite do Parlamento que, mesmo muito bem alimentado, ainda quer mais.

Enfim, as próximas semanas serão de grande importância para os rumos que o barco chamado Brasil irá tomar, sempre lembrando que no segundo semestre ocorrerão as fundamentais eleições municipais com vistas à sucessão presidencial em 2026. Muito está em jogo, para todos.

André Pereira César

Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni - Consultor Jurídico

Comments are closed.