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Show, chuva e polarização

Dois eventos totalmente distintos causaram grande comoção em todo o país nos últimos dias. De um lado, o show da cantora Madonna na praia de Copacabana, objeto de intensa discussão nas redes sociais. De outro, as chuvas torrenciais no Rio Grande do Sul, que geraram morte e destruição e mobilizaram brasileiros de todos os cantos, e foram alvos de fake news.

“A camiseta do escrete canarinho foi retomada dos bolsonaristas e devolvida aos brasileiros”. A avaliação corrente entre muitos apoiadores do atual governo e adversários do ex-presidente Jair Bolsonaro (PL), a princípio, reforça a polarização há tempos em curso no país. Na verdade, nada mudou. Lulistas e bolsonaristas seguem em posições absolutamente opostas, sem espaço para qualquer entendimento.

No caso do show do último sábado, por exemplo, o que se viu foram opiniões divergentes, em especial as fakes news amplamente espalhadas nas redes sociais. De um lado, os admiradores de Madonna elogiando seu show pirotécnico, que contou com a participação de artistas tidos como “polêmicos” - Anitta e Pablo Vittar. De outro, muitas críticas dos conservadores e religiosos ao evento, ao perfil médio do público presente e ao comportamento da cantora e de seus convidados e da tentativa de envolver a todo custo o atual governo federal no patrocínio do evento, o que não ocorreu.

Nesse “debate”, salta aos olhos o viés político. Voltando à questão da camiseta da seleção, o que poderá ocorrer a partir de agora é uma espécie de troca de guarda - de símbolo bolsonarista, passa a ser identificada com o governo lulista e a defesa da democracia. Mas a polarização segue intocada.

No caso das chuvas no Rio Grande do Sul registra-se, nesse momento, um quadro de união nacional, pelo menos é o que se vê na vida real, já que nas redes sociais, as fakes news contra o governo de Lula estão pautando as discussões. Diversos influenciadores de espectro conservador ajudam na disseminação dessas notícias falsas. Por outro lado, parlamentares de todos os partidos e a sociedade civil em geral juntam forças para ajudar as muitas vítimas da tragédia. A questão que fica é se essa situação se manterá ou, com o passar do tempo e com a volta da normalidade, os embates serão retomados. Essa última hipótese é a mais provável.

Na verdade, a calamidade gaúcha é apenas um ponto fora da curva na cena brasileira. A polarização (ou calcificação, como queira) segue incólume, dividindo famílias e amigos. Da política para o dia a dia de todos. Difícil sair ileso desse processo.

Enfim, quem acredita (ou acreditava) na retomada do diálogo entre as partes seguirá frustrado em suas expectativas. Nem a camiseta canarinho, gentilmente utilizada por Madonna, resolve. Nada de novo no front.

André Pereira César

Cientista Político

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