Eleições 2022: sobre a chapa Bolsonaro/Braga Netto - Política - Hold

Eleições 2022: sobre a chapa Bolsonaro/Braga Netto

Contrariando uma prática recorrente no país desde que a possibilidade de reeleição foi instaurada, o presidente Jair Bolsonaro (PL) mudou de vice na chapa que tenta a recondução ao Planalto. Sai o general da reserva Hamilton Mourão (Republicanos), que disputará uma vaga no Senado Federal pelo Rio Grande do Sul, e entra o também general aposentado, Walter Braga Netto (PL). Essa não é a única novidade em relação à vitoriosa campanha de 2018.

A postura de outsider de Bolsonaro na disputa que o levou ao Planalto tornou-se passado. A chamada “nova política” que dominou os debates naquele pleito cedeu espaço para o Centrão, que se tornou peça fundamental para sustentação do projeto bolsonarista. Na prática, PL, PP e Republicanos dão as cartas não só na chapa presidencial como também nos rumos do governo de Bolsonaro. Questão de sobrevivência para o atual presidente.

A rigor, Bolsonaro jamais foi um outsider. Pelo contrário, ele integra há tempos o establishment político. Expulso do Exército por insubordinação, ele encontrou na vida Legislativa seu norte. Apesar de nascido em Glicério, cidade do interior de São Paulo, fez carreira no estado do Rio de Janeiro. Vereador da capital por um mandato, ele foi deputado federal de 1991 a 2018. Nesse período, deixou claro que fidelidade partidária nunca foi seu forte. Ele passou por PDC, PP, PPR, PPB, PTB, PFL, PSC, PSL e, desde 2021, está no PL. Um comportamento que inevitavelmente desperta desconfiança em seus pares.

O hoje presidente era o típico representante do chamado “baixo clero” do Congresso Nacional - um parlamentar que não se destaca por ser formulador ou líder e sempre fica à margem dos grandes debates. Esse estilo, na verdade, já se via no Bolsonaro da caserna. Seu histórico mostra um militar mais preocupado em “realizar-se econômica e financeiramente”, segundo seus superiores à época. Ele envolveu-se em casos polêmicos e, na segunda metade da década de oitenta, foi expulso da corporação com a patente de capitão. Começava aí a nascer o político.

Na Câmara dos Deputados, teve atritos e discussões com muitos pares. Essa maneira de atuar, ao final, caiu no gosto de vastos setores do eleitorado, que acabaram levando-o ao Planalto. Por sinal, seus três filhos com mandatos eletivos - o senador Flávio, o deputado federal Eduardo e o vereador Carlos - emulam seu comportamento, cada um a seu modo e todos igualmente com sucesso. Tal pai, tais filhos.

Já o candidato a vice, Braga Netto, teve longa e bem-sucedida carreira no Exército. Mineiro de Belo Horizonte, ele surgiu para o grande público quando foi nomeado pelo então presidente Michel Temer (MDB) para o cargo de interventor federal na secretaria de Segurança do Rio de Janeiro, no início de 2018. Começava efetivamente ali uma relação do militar com o poder que ganhou força no governo Bolsonaro. Braga Netto foi ministro-chefe da Casa Civil e depois ocupou a pasta da Defesa. Mais ainda, tornou-se importante interlocutor do titular do Planalto e uma das mais influentes figuras do governo. Sua indicação para vice, portanto, não surpreende aos mais atentos observadores.

Um dado importante. A aproximação entre Bolsonaro e o Centrão gerou a expectativa de que o vice fosse um político com experiência - por exemplo, o senador licenciado e ministro-chefe da Casa Civil, Ciro Nogueira (PP/PI), ou o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL). Também cogitou-se da possibilidade de uma mulher assumir a posição, como a ex-ministra Damares Alves. Nada feito. Com receio de algum tipo de “golpismo” da parte dos políticos, o presidente optou por uma solução caseira e novamente colocou um militar na chapa. Blindagem total.

Quais os ativos da chapa reeleitoral? Em primeiro lugar, Bolsonaro e seus aliados terão bom tempo de televisão durante a campanha (ao contrário do ocorrido em 2018). Também a primeira-dama, Michelle Bolsonaro, poderá ser protagonista na disputa, em especial na busca pelo voto feminino e evangélico. Além disso, o poder da caneta é fundamental em um processo eleitoral complicado como o brasileiro. Não por acaso, o governo aposta nos recentes “pacotes de bondades” colocados em prática. Auxílios de todo tipo e redução nos preços dos combustíveis podem ter algum impacto junto ao eleitor. Por fim, o discurso em defesa da família e dos costumes atinge o cidadão médio - evangélicos e outros grupos conservadores tendem a apoiar essa narrativa.

No entanto, os desafios para Bolsonaro são ainda maiores. De saída, ele tem pela frente um adversário com forte apelo popular, o ex-presidente Lula (PT), que se mostra consistente nas diferentes pesquisas eleitorais disponíveis. Mas o maior obstáculo para o atual presidente é sua própria gestão. A economia ainda claudica e o cenário externo, com ameaça de recessão global, apenas piora o quadro. Inflação, desemprego, desalento e fome dominam o país, e os mercados (que apoiaram Bolsonaro em 2018) aparentemente perderam a empolgação com o grupo ora no poder. Para finalizar, a desastrosa ação do governo no combate à pandemia será um poderoso instrumento de propaganda negativa a ser utilizada, na campanha, pelas oposições.

É claro que a campanha apenas começa e, ao longo das próximas semanas, o quadro pode mudar. Difícil, mas não impossível. As redes sociais, território bem utilizado pelo bolsonarismo, podem se tornar novamente atores de peso no processo sucessório. Bolsonaro e seus aliados, no momento, estão em desvantagem, mas a capacidade de reação de quem está sentado na cadeira presidencial não pode ser subestimada.

André Pereira César

Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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