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Brasil: depois do carnaval

Foto: Ivanildo Machado

Encerrado o feriado de carnaval - período que a História lembrará como “o festejo da pandemia”, com as ruas vazias -, o país retoma a rotina. O mundo da política, do judiciário, da economia e da saúde pública, porém, esteve em ebulição nos últimos dias. Diferentes fatos reforçam a percepção de que o Brasil vive um momento singular. Essas ocorrências terão impacto sobre todos a curto e médio prazos.

. Passam de 240 mil as mortes de brasileiros em decorrência da COVID-19. Há semanas, a média diária de óbitos supera a marca de mil, o que indica que a pandemia ainda está longe de ser controlada no país.

. Enquanto a pandemia segue solta, a vacinação da população passa por uma situação crítica. Em muitas capitais e cidades dos mais variados portes, o estoque de vacina chegou ao fim. É o caso, por exemplo, do Rio de Janeiro, hoje o município com o maior número de casos da doença registrados em todo o Brasil.

. Esse quadro, e com o avanço das novas variantes do vírus por todo país, levou a Confederação Nacional de Municípios (CNM) a solicitar o afastamento do ministro da Saúde, Eduardo Pazuello, sob a alegação de má gestão durante a crise sanitária. Igualmente o Fórum de Governadores, que se reunirá nos próximos dias com o titular da pasta, pressiona por sua demissão, que poderá ocorrer muito em breve. A situação do ministro Pazuello não é confortável. Inquérito perante o STF, risco de abertura de uma CPMI no Congresso e pressão de prefeitos e governadores pela sua demissão.

. Enquanto a crise na saúde parece longe do fim, o Congresso Nacional tenta definir as prioridades para votação nas próximas semanas. De imediato, deverão ser apreciadas a MP que facilita a compra de vacinas e a chamada PEC Emergencial. Também a Lei Orçamentária de 2021 deverá ser apreciada em breve. As reformas mais estruturais, porém, demandarão negociações extras entre o governo e as lideranças partidárias e correm o sério risco de ficarem para o segundo semestre. Porém, apesar do presidente Arthur Lira (PP/AL) ter se manifestado recentemente de forma institucional por uma agenda ampla e reformista, o que se sabe é que, nos bastidores, grande parte da base trabalha apenas pela aprovação de projetos pontuais com foco na chamada “pauta de costumes”.

. Em paralelo, sob o comando de Lira, um grupo de deputados começa a se destacar nos bastidores da Câmara. Esse grupo é composto por parlamentares de perfil discreto, mas que exercem grande influência sobre seus pares. A imprensa noticiou, inclusive, que às vésperas da eleição para a presidência da Casa, Lira teria acompanhado esses parlamentares em reunião com representantes da indústria, para discutir a reforma tributária.

. O ex-ministro da Fazenda e atual secretário de Fazenda do governo paulista, Henrique Meirelles, após passar pelo MDB, filiou-se ao PSD, partido de Gilberto Kassab. A movimentação de Meirelles merece atenção - ele é peça chave na gestão de João Dória (PSDB), desafeto do presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e pré-candidato à presidência da República. Seu ingresso na legenda, com intuito de uma possível candidatura ao Senado Federal em 2022, também visa estabelecer um canal de comunicação entre o tucano e Kassab.

. Livro recém-lançado com depoimento do general da reserva Eduardo Villas Bôas causou polêmica no mundo jurídico e político. Na publicação, o militar afirma que outros integrantes da cúpula das Forças Armadas o auxiliaram a redigir uma nota sobre o julgamento do ex-presidente Lula pelo Supremo Tribunal Federal (STF), há três anos.

. À época, a nota foi vista por muitos como uma ameaça velada da caserna sobre a Corte caso o ex-presidente fosse absolvido. Ao final, Lula foi impedido de disputar as eleições de 2018, abrindo o caminho para a vitória de Bolsonaro.

. Em reação às declarações do general, o deputado Daniel Silveira (PSL/RJ) atacou ministros do STF, desqualificando muitos deles e, no limite, incitando a população a partir para a violência contra a instituição. Em decorrência, o ministro Alexandre de Moraes expediu ordem de prisão contra o parlamentar, já cumprida pela Polícia Federal.

. O plenário da Corte julgará o caso de Silveira e a tendência é a pela confirmação da decisão monocrática do ministro Alexandre de Moraes pela prisão. Já a Mesa Diretora da Câmara dos Deputados se reunirá para definir os próximos passos e o plenário da Casa decidirá, em votação aberta, sobre a prisão do deputado.

. A situação do deputado é complicada. O PSL já anunciou sua expulsão e a Rede Sustentabilidade formula denúncia ao Conselho de Ética com pedido de cassação do seu mandato. O “affair Silveira” pode contaminar a retomada das votações no Congresso nos próximos dias.

André Pereira César

Cientista Político

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