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Um fantasma chamado orçamento

Sabia-se, desde meados do ano passado, que o atraso na votação da lei orçamentária de 2021 traria dores de cabeça para o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Resolvida a questão na segunda quinzena de abril, mesmo após a sua aprovação, o orçamento segue assombrando o Planalto - trata-se de um fantasma a incomodar o governo.

Revelado no final de semana pelo jornal O Estado de São Paulo, o chamado “orçamento secreto” do governo, estimado em R$ 3 bilhões em emendas, pode se tornar alvo de investigações. Parte desses recursos foi destinado à aquisição de tratores e equipamentos agrícolas, a preços, de acordo com a reportagem, maiores do que os de mercado. Os beneficiários da ação são aliados de Bolsonaro, como os senadores Davi Alcolumbre (DEM/AP) e Ciro Nogueira (PP/PI), o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), e a atual ministra da Secretaria de Governo, deputada Flávia Arruda (PL/DF) - 42 parlamentares ao todo.

O centro da questão é o ministério do Desenvolvimento Regional. De acordo com a legislação, a pasta seria a responsável pela aplicação dos recursos, e não os parlamentares, como ocorreu. Ressalte-se aqui que a operação se deu em meio à crise da pandemia, com a ausência de insumos para o combate à COVID-19. Para os adversários do governo, um terreno a ser explorado.

Não somente tratores estão no foco dessa operação. Com grande peso político nas regiões Norte e Nordeste, a Companhia de Desenvolvimento dos Vales do São Francisco e do Parnaíba (Codevasf), hoje comandada pelo Centrão, receberá cerca de 30% dos recursos do “orçamento secreto”.

Do outro lado, o titular do Planalto segue reduzindo as verbas orçamentárias para diferentes órgãos da máquina estatal. Após o cancelamento do Censo, que seria essencial para o estabelecimento de políticas públicas, por conta do corte no orçamento anual do IBGE, agora é a vez do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), que ficará sem recursos para dar sequência a seu programa de modernização. O combate a ilícitos financeiros fica severamente prejudicado.

Na prática, Bolsonaro utiliza a transferência do controle de recursos públicos como moeda de troca para angariar apoio no Congresso Nacional sem a transparência necessária ou o crivo dos demais órgãos de controle. Em momentos outros, a reação a tal movimento gerou a criação de duas CPIs e foi alvo de um julgamento pelo STF.

O discurso presidencial de praticar a “nova política”, sem o loteamento de cargos no governo, perde força. Uma nova crise se desenha no horizonte. Mais um front de batalha sendo aberto, justamente no momento que o inverno está chegando.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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