Para onde vai a agenda liberal? - Economia - Hold

Para onde vai a agenda liberal?

“Se me perguntarem se houve uma debandada hoje, houve”. A frase do ministro da Economia, Paulo Guedes, sintetiza o difícil momento vivido por sua pasta. Ele perdeu, de uma só vez, dois importantes colaboradores, responsáveis pela formulação e implementação de políticas fundamentais para o país. Afinal, para onde vai a (esvaziada) agenda liberal?

Apenas para relembrar, abordamos nesse espaço, em 15 de junho, a saída do então secretário do Tesouro Nacional, Mansueto Almeida, um dos homens fortes da equipe econômica, e suas possíveis consequências. A seguir, anunciaram desligamento do governo o presidente do Banco do Brasil, Rubens Novaes – que saiu “batendo” – , e o diretor de programas da secretaria de Fazenda do ministério da Economia, Caio Megale. Três perdas expressivas.

Agora, as saídas simultâneas do secretário de Desestatização, Salim Mattar, e do secretário de Gestão, Paulo Uebel, deixam o governo ainda mais manco. Liberais de carteirinha, eles eram respectivamente os responsáveis pelo programa de privatização de estatais e pela reforma administrativa - duas questões centrais na cartilha do ministro Guedes. Saem, também, com declarações muito fortes acerca da falta de empenho do establishment no avanço da desburocratização e privatização.  

Cabe ressaltar que o apoio do mercado e de parcela expressiva da opinião pública a Jair Bolsonaro, ainda durante a campanha eleitoral de 2018, se deu em larga medida em função de dois pontos - a perspectiva real de se derrotar o petismo e a pauta liberal de Guedes.

Esse último quesito era baseado em quatro pilares - reforma da Previdência, reforma tributária, reforma administrativa e privatizações. Dessas, apenas a reforma da Previdência foi aprovada basicamente, apesar do governo, devido à ação do Congresso Nacional, e a tributária – por iniciativa do Parlamento – segue em discussão, mas ainda longe de uma definição. O restante não registrou avanços.

No caso da reforma administrativa, Bolsonaro praticamente desistiu de enviar a proposta ao Congresso temendo um confronto direto com setores do funcionalismo, articulados e poderosos. Já a agenda de privatizações igualmente enfrenta resistência de grupos contrários à venda de estatais, também poderosos. Aqui, é importante frisar que o próprio presidente da República, com seu perfil nacional-desenvolvimentista (atestado por sua atuação parlamentar), nunca se empenhou pelo sucesso dessa agenda.

Por fim, a chegada da pandemia tornou necessária uma maior presença do Estado na vida nacional, esvaziando consequentemente o discurso privatista; e a entrada, no governo, do Centrão – bloco que não tem grandes afinidades ideológicas com o liberalismo – torna ainda mais distante a execução plena da agenda de Guedes. Em um ano e meio de gestão Bolsonaro, o jogo mudou de maneira radical.

O ministro da Economia encontra-se em uma autêntica encruzilhada. Apesar de publicamente declarar-se firme no cargo, é inegável que ele foi colocado em xeque. Assim, uma eventual saída de Paulo Guedes do comando de sua pasta não representaria uma grande surpresa.

André Pereira César

Cientista Político

Comments are closed.