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Diário da transição: os três Poderes

Quinta-feira, 10 de novembro. As primeiras reuniões do presidente eleito Lula (PT) com as cúpulas do Legislativo e do Judiciário indicam que o Planalto buscará uma relação de harmonia entre os Poderes. Como afirmou o deputado Alexandre Padilha (PT/SP), o objetivo é dar um “choque de diálogo” do Planalto com o Congresso Nacional e os Tribunais Superiores.

Sem entrar no mérito, o presidente Jair Bolsonaro (PL) manteve, ao longo dos últimos quatro anos, uma relação conturbada com seus vizinhos de Praça dos Três Poderes. Com o Legislativo, a convivência se deu em dois tempos - primeiro, uma espécie de ruptura com o modelo de coalizão do presidencialismo brasileiro, ao se afastar dos partidos e negociar diretamente com as bancadas setoriais e temáticas; depois, dado o fracasso da estratégia inicial, foi ceder espaço e entregar o comando do governo ao Centrão a partir de meados de 2020, jogando por terra todo o discurso de campanha.

Já com o Judiciário, registrou-se tensão permanente, com ataques diretos do atual mandatário tanto ao Supremo Tribunal Federal (STF) quanto ao Tribunal Superior Eleitoral (TSE). As ameaças de contestação ao resultado das eleições sintetizam esse quadro, com os ministros Alexandre de Moraes, Édson Fachin e Luís Roberto Barroso como os alvos principais.

Agora, o novo governo deu início aos trabalhos de retomada do entendimento, do equilíbrio institucional entre os Poderes. A conversa de Lula com o presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL), talvez tenha sido a mais importante dessa série inicial, ao menos em termos práticos. Foi a primeira vez que os dois se encontraram pessoalmente. Em linhas gerais, o deputado se comprometeu a não criar obstáculos para a votação da chamada PEC da Transição, que manterá o auxílio de R$ 600 reais para a famílias mais carentes a partir de janeiro próximo, e sinalizou que aceita discutir o futuro do orçamento secreto. Em contrapartida, o petista afirmou que não se envolverá na disputa pelo comando da Casa, em fevereiro. Lira, como se sabe, só pensa naquilo.

Com o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), o encontro foi mais protocolar e não havia, em tese, riscos de algum conflito vir à tona. O senador havia se aproximado de Lula durante a campanha eleitoral em Minas Gerais e, além disso, o PSD, Gilberto Kassab à frente, já integra o grupo de transição. Jogo jogado.

A mais simbólica das conversas, no entanto, se deu com os ministros do STF. O simbolismo marcou presença de saída, quando o colegiado, em fila, cumprimentou o presidente eleito. Mesmo os dois indicados por Bolsonaro, os ministros Kassio Nunes Marques e André Mendonça, mostraram-se bastante à vontade no encontro. Pontos para todos.

Com a cúpula do Judiciário, foram discutidas a ações do futuro governo em educação e meio ambiente, áreas que se sabe críticas para os destinos da nação. Indo além, Lula reforçou a necessidade de se retomar o diálogo efetivo entre os Poderes, sinalizando uma mudança de sintonia a partir de janeiro. Espíritos desarmadas, ânimos renovados, ao menos por ora.

Toda mudança efetiva de ciclo político, como a que se observa agora, gera esperanças e boa vontade entre os atores envolvidos no processo. Ao governo que assumirá em janeiro caberá manter o espírito de diálogo e entendimento permanentes. Dadas as dificuldades de toda ordem que se avizinham, em especial depois da posse em 1º de janeiro de 2023, não será tarefa das mais triviais.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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