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Diário da transição: o futuro do orçamento secreto

Sexta-feira, 2, e sábado, 3 de dezembro. O plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) poderá decidir, nos próximos dias, o futuro do orçamento secreto. A presidente da Corte e relatora do caso, ministra Rosa Weber, liberou para julgamento as ações que questionam a constitucionalidade do mecanismo.

A princípio, a data marcada é a quarta-feira, 7 de dezembro, mas como constam da pauta outras ações, o julgamento poderá não ocorrer nessa data. O mundo político, é claro, aguarda a definição com ansiedade.

Aos fatos. O STF analisará três ações que questionam a constitucionalidade do pagamento das emendas de relator (RP9, o chamado orçamento secreto), de autoria do PSOL, do Cidadania e do PSB - as três legendas, por sinal, são hoje politicamente alinhadas ao presidente eleito Lula (PT).

O chamado orçamento secreto surgiu com a criação de uma nova modalidade de emendas parlamentares – recursos do Orçamento direcionados por parlamentares para suas bases políticas ou estados de origem.

Em 2019, o Congresso Nacional aprovou novas regras, que ampliaram o poder do relator-geral da peça orçamentária que, assim, passou a liberar valores do Orçamento a pedido de deputados e senadores. A falta de transparência e os critérios de distribuição desse dinheiro também são questionados por priorizar a base aliada do governo de plantão. Em 2021 e 2022, o Planalto destinou bilhões de reais para essas emendas de relator — o que foi interpretado como uma forma de negociação política com o Legislativo.

Em 2021, a ministra relatora, em decisão monocrática, suspendeu temporariamente as emendas e determinou que o Congresso Nacional garantisse transparência à execução. A decisão foi posteriormente confirmada pelo plenário em sessão virtual - o país enfrentava o auge da pandemia de Covid 19. Após ato conjunto das duas Casas do Legislativo, a execução das emendas foi liberada.

A transparência, entretanto, é limitada. As informações são divulgadas pela Comissão Mista de Orçamento do Congresso Nacional, mas o sistema dificulta o acesso aos dados. Mais ainda, não se fica sabendo qual parlamentar “apadrinhou” determinada transferência de recurso. A sociedade, na prática, continua às cegas.

Importante dizer que as emendas de relator sempre existiram, mas eram usadas muito raramente. Dada a escassez de recursos, o orçamento contemplava pontualmente cada área a ser coberta. Não havia espaço orçamentário, tanto que sempre havia a necessidade de se fazer ajustes, seja por Decreto do Planalto, através dos PLN’s para suplementação de crédito ou pelas MP’s de créditos extras. Em alguns anos, as emendas de relator não alcançaram a monta de R$ 5 milhões - hoje está em R$ 19,7 bilhões. Para a próxima Legislatura, com as emendas de bancada, individuais e de relator, já há reserva de R$ 40 bilhões. Ou seja, 1/4 do Bolsa Família, que poderia atender pelo menos 42 milhões de brasileiros em situação de miserabilidade.

Esse movimento demonstra claramente a sanha do Congresso Nacional de se apropriar, cada vez mais, do orçamento. Em 2015 o então deputado Eduardo Cunha (PTB/SP) utilizou as chamadas emendas individuais. Rodrigo Maia (PSDB/RJ), em 2019, fez uso das emendas de bancada, e em 2022, Arthur Lira (PP/AL) tentou emplacar a impositividade nas emendas de relator.

Há quem compare o orçamento secreto ao mensalão, que marcou a primeira gestão de Lula. Outros, por sua vez, avaliam que o modelo realiza um trabalho de contenção de potenciais crises entre o Executivo e o Legislativo. De todo modo, é necessária maior transparência a todo o processo. Eis a resposta que se espera do STF.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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