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Diário da transição: eleição sem fim

Quarta-feira, 23 de novembro. A ação do presidente nacional do PL, Valdemar Costa Neto, solicitando que o Tribunal Superior Eleitoral (TSE) anule o resultado apurado em centenas de milhares de urnas no segundo turno do processo sucessório, é mais um claro indicativo de que, para os aliados de Jair Bolsonaro (PL), o pleito ainda não se encerrou. O jogo segue para alguns, ao menos por ora.

Na ação, argumenta-se que as urnas citadas “apresentaram problemas crônicos de desconformidade irreparável no seu funcionamento”. Detalhe - o partido não apresentou provas de fraude, apenas uma análise preparada por supostas autoridades no assunto que afirmaram que essas específicas urnas são frágeis. Muito pouco, mas serve para manter a massa bolsonarista mais radical mobilizada - garantia de mais barulho na frente de quartéis e em algumas rodovias.

Por sua vez, a resposta (quase imediata) do presidente da Corte eleitoral, ministro Alexandre de Moraes, solicitando que Costa Neto acrescente na peça, sob pena de indeferimento, as urnas utilizadas também no primeiro turno, tem dois focos claros. Primeiro, mostra que o TSE não está disposto a dar sequência a mais essa polêmica. Mais importante, porém, ela representa uma armadilha para o PL, que ficaria sujeito a ver revertida a vitória em especial na Câmara dos Deputados, onde elegeu a maior bancada, com 99 parlamentares.

Para alguns parlamentares do partido de Valdemar, como os deputados federais reeleitos Carlos Jordy (PL/RJ) e Bia Kicis (PL/DF), por exemplo, dois dos mais radicais apoiadores de Bolsonaro, a perda do mandato dos eleitos no pleito de 2022 parece não importar, desde que se apure, com transparência, o processo eleitoral.

Trocando em miúdos, Costa Neto tentou dar um xeque, mas foi contra-atacado com um truco. Na prática, mais um movimento na queda de braço entre Bolsonaro e o Judiciário. O jogo segue bruto.

Mais ainda, a ação mostra que os aliados do atual presidente correm o risco de ser isolados mais e mais. Por exemplo, o PSDB, partido que caminha para fazer oposição ao presidente eleito Lula (PT), considerou “uma insensatez” o pedido de anulação dos resultados do segundo turno. A posição da legenda é carregada de simbolismo político pois, em 2014, ela contestou a recondução da então presidente Dilma Rousseff (PT), agravando uma crise que acabou desaguando no impeachment da petista dois anos depois. Os tempos mudaram. E o Republicanos, partido que vai governar o estado de São Paulo com o ex-ministro de Bolsonaro, Tarcísio de Freitas, declarou publicamente que não fará oposição ao novo governo.

Também no Congresso Nacional o movimento não foi bem recebido. O presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), que trabalha para ser reconduzido ao comando da Casa no início do próximo ano, reforçou sua percepção sobre a confiabilidade do sistema eleitoral, afirmando que o resultado do pleito é “inquestionável”. A posição do senador certamente reflete a de seus pares, hoje mais preocupados com a futura agenda legislativa, em especial a aguardada PEC da Transição.

Em suma, o PL, por intermédio de seu presidente nacional, assumiu uma posição de risco que, no limite, ameaça a credibilidade da legenda. A ação de agora torna mais difícil qualquer eventual composição com o governo eleito. Os valores das negociações subiram de patamar.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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