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Movimentos em desconstrução

As manifestações contra o governo de Jair Bolsonaro (sem partido) do último domingo, 12 de setembro, ainda não decantaram, mas alguns pontos importantes devem ser ressaltados de imediato.

Em primeiro lugar, ficou claro que os patrocinadores dos eventos, como o MBL e o Vem Pra Rua, atingiram o limite de suas possibilidades no campo da política. Esses movimentos surgiram na esteira do antipetismo e ganharam corpo durante o processo que resultou no afastamento da então presidente Dilma Rousseff (PT) e, a partir de então, foram assimilados pelo establishment, tendo inclusive representantes de destaque eleitos para cargos eletivos no Congresso Nacional - caso dos deputados Kim Kataguiri (DEM/SP) e Carla Zambelli (PSL/SP). Encontros com o então presidente da Câmara dos Deputados, Eduardo Cunha, fazem parte do histórico desses dois movimentos.

O problema é que esses grupos não conseguem se dissociar da imagem de corresponsáveis pelo impeachment de Dilma e a eleição de Bolsonaro, em 2018. Parcela significativa do eleitorado, desse modo, mantém reservas e prefere não engrossar as fileiras de suas manifestações. Isso explica, em parte, o esvaziamento registrado ontem em São Paulo e Brasília.

Também chama a atenção a participação da chamada “terceira via”. Lideranças que hoje se apresentam como alternativas a Bolsonaro e ao ex-presidente Lula (PT), como o neopedetista Ciro Gomes, os governadores tucanos João Dória (SP) e Eduardo Leite (RS), o ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM) e a senadora Simone Tebet (MDB/MS), ainda são notórios desconhecidos do eleitor médio. Ao comparecem para falar a um público reduzido, eles acabaram se apequenando além da baixa concentração de pessoas. Um erro tático, que poderá cobrar a fatura em um momento próximo. E a esquerda não vai esquecer mais esse movimento de Ciro Gomes, diga-se.

Ficou claro, ainda, que o grande ausente dos eventos anti-Bolsonaro foi o PT, e também os demais partidos de esquerda. Hoje, o PT, com Lula à frente, é o grande mobilizador da parcela (expressiva) da sociedade que se opõe ao titular do Planalto. Sem a participação da legenda e de partidos de esquerda como PSOL, por exemplo, o movimento não ganha tração, como se viu. Assim, o mote inicial “Nem Bolsonaro, nem Lula” se mostrou um equívoco, afastando qualquer possibilidade de diálogo entre as partes.

E, diferente de análises outras acerca das manifestações do último dia 12, restou evidente, primeiro, que esses movimentos travestidos de um “fora Bolsonaro” com intuito de se viabilizar a tal da “terceira via” não contará com a adesão dos partidos de esquerda. Segundo, deve-se ter bastante claro que, para se ganhar corpo e força popular suficientes como instrumento de pressão sobre o Parlamento e demais atores para um afastamento de Bolsonaro, todos devem buscar uma construção coletiva e com um fim único. Sem esse entendimento, o movimento não decola.

Ademais, Lula, favorito hoje segundo as pesquisas de intenção de voto, deve chamar as lideranças a um entendimento em torno de um governo de transição, que trabalhará para entregar um país minimamente ordenado ao final de 2026. Só assim, num grande acordo nacional, terá condições de aglutinar, em seu entorno, todos os movimentos de oposição a Bolsonaro, quaisquer que sejam eles.

Enquanto isso não ocorre, a reedição de um movimento do tipo “Diretas Já”, hoje, parece pouco provável. Naquele momento, o governo militar dava seus últimos suspiros e toda a oposição se uniu em torno da emenda Dante de Oliveira, que objetivava eleição imediata para presidente da República. Um momento único na história política brasileira. Algo similar a isso deve ser tentado, mas demandará intensa negociação, que não aconteceu, dado o mote “Nem Bolsonaro, nem Lula”, como se viu.

O saldo final, por ora, é positivo para o governo. Bolsonaro, aliados e apoiadores podem se utilizar das imagens do domingo último e compará-las com o 7 de setembro. Para o eleitor bolsonarista, isso basta.

André Pereira César
Cientista Político

Alvaro Maimoni
Consultor Jurídico

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