Eleições 2022: onze pontos para entender o momento atual - Política - Hold

Eleições 2022: onze pontos para entender o momento atual

Como se sabe, cada disputa eleitoral tem sua história e suas especificidades. Por exemplo, a primeira eleição de Fernando Henrique Cardoso teve o recém-lançado e bem sucedido Plano Real como protagonista; o primeiro êxito de Lula, por sua vez, foi escorado na moderação do discurso do PT, materializado na “Carta ao Povo Brasileiro”; a então pouco conhecida Dilma Rousseff foi a “mãe do PAC” e, em 2018, Bolsonaro se aproveitou da onda ultraconservadora.

Agora, em 2022, elencamos onze pontos que consideramos essenciais para o entendimento do processo eleitoral:

1.  Uma outra polarização - polarização política, a rigor, sempre houve no Brasil. Basta lembrar os embates entre PSDB e PT, as duas legendas que por anos disputaram voto a voto a presidência. Nesse período, outras agremiações circulavam em torno de tucanos e petistas (“satélites” como PFL, PMDB, PP, PL, PTB e esquerda), em um processo fundamental para a governabilidade. O que se vê hoje é um fenômeno de natureza distinta - um confronto puramente ideológico, onde o adversário passa à condição de inimigo (com toda violência decorrente disso). Ecos de Carl Schmitt em pleno século XXI.

2.  Avaliação crítica do governo Bolsonaro - as eleições de 2022 têm como um dos pontos centrais a avaliação da gestão Bolsonaro. Nesse quesito, ele não se sai bem, como apontam as pesquisas de opinião pública. Na verdade, o titular do Planalto jamais abandonou o figurino de deputado - ele terceirizou sua administração e não assumiu responsabilidades, especialmente em momentos delicados como na condução da pandemia. A campanha permanente do presidente pode cobrar (elevada) fatura já no próximo domingo.

3.  Lula caminha para o centro - ao indicar o ex-governador Geraldo Alckmin (PSB) para o cargo de vice em sua chapa, Lula sinalizou qual seria o norte da campanha - incluir na coligação o maior número aliados possível, incluindo o centro e a centro-direita. Faltando poucos dias para o primeiro turno, a estratégia parece ter obtido êxito. A adesão de oito ex-candidatos a presidente da República, incluindo Marina Silva e Henrique Meirelles, a aproximação com as elites dos mundos empresarial e financeiro e também do Judiciário (Joaquim Barbosa e mais outros três ex-presidentes do STF), a mobilização de artistas e os economistas que entraram no jogo (Lara Resende e Pérsio Árida entre eles) não geram votos, mas são carregadas de simbolismo. Um movimento parece ter começado.

4.  O fracasso da terceira via - cantada em verso e prosa no período da pré-campanha, a chamada terceira via não decolou por motivos bastante simples - não havia um projeto claro, não havia unidade e não havia interlocução mais direta com eleitor. O que se viu foi uma briga de egos, cujo resultado é o desempenho pífio de Soraya Thronicke (União Brasil), Simone Tebet (MDB) e de Ciro Gomes (PDT) - esse último, por sinal, sairá politicamente menor da eleição.

5.  Economia, a principal preocupação - saiu de cena a corrupção, que mobilizou boa parte do eleitorado em 2018, e voltou a preocupação com a economia. As elevadas taxas de inflação, juros e desemprego, além da fome e da miséria, afetam a todos e nortearam o debate eleitoral. Em suma, menos Sérgio Moro, mais Henrique Meirelles.

6.  “Nova política” em xeque - sensação a partir das manifestações de junho de 2013, que desaguaram no impeachment da presidente Dilma Rousseff e na eleição de Bolsonaro, a chamada “nova política” vem perdendo espaço no cenário geral e não deverá repetir agora o desempenho de 2018. Faltaram capacidade de articulação e de negociação para os políticos que ingressaram no Congresso Nacional a partir dessa onda. Muitos não retornarão para a próxima legislatura.

7.  Os militares - a caserna tornou-se protagonista no debate político dos últimos anos e segue marcando presença no processo eleitoral. Os milhares de postos ocupados por integrantes das Forças Armadas na máquina estatal inevitavelmente chamaram a atenção. Pior, em momentos agudos, como a desastrosa gestão militar no ministério da Saúde durante a pandemia, ficaram evidentes as limitações dos militares, o que abalou sua imagem diante da opinião pública.

8.  O Centrão - pragmático por natureza, o Centrão repetiu no governo Bolsonaro um script já conhecido. Aproxima-se do presidente de plantão e ocupa espaços estratégicos - de maneira legítima, diga-se. Assim, não causa espanto algum as já anunciadas conversas entre setores do bloco e emissários de Lula (por sinal, os dois lados trabalharam juntos em gestões petistas). Resta saber como se dará uma eventual acomodação.

9.  Pesquisas eleitorais - uma profusão de institutos marcou presença no processo eleitoral desse ano, despertando o interesse de parcela significativa da população, em especial os setores mais escolarizados. Apesar das diferenças metodológicas entre eles, na reta final da sucessão presidencial constatou-se uma convergência nas tendências, com a consolidação da candidatura Lula na liderança.

10. Redes sociais e Fake News - redes sociais e Fake News já haviam marcado forte presença nas eleições de 2018, mas agora nota-se um aperfeiçoamento dos instrumentos utilizados pelos responsáveis pelas áreas digitais das candidaturas. Por exemplo, o Deepfake - técnica que permite mostrar o rosto de uma pessoa em fotos ou vídeos alterados com a ajuda de inteligência artificial - tornou-se prática comum. 

11. Ataques ao sistema eleitoral - por fim, os recorrentes ataques ao sistema eleitoral brasileiro, com destaque para o Tribunal Superior Eleitoral (TSE), tem sido uma marca constante (bolsonarista) da disputa ora em curso e pode ganhar ainda mais força a partir da divulgação dos resultados do primeiro turno. A situação está longe de resolvida.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

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