No horizonte, já se avista uma crise de confiança - Linha de Pensamento - Hold

No horizonte, já se avista uma crise de confiança

Algo se movimenta na cena política brasileira e uma crise está em gestação. Os principais atores - partidos, mídia e outros - emitem sinais importantes, como que contratando um quadro de instabilidade. O que vem pela frente?

Antes de entrar nos detalhes da questão, é necessário frisar que os eventos ganham vida própria e ficam fora do controle das personagens envolvidas. Ao governo Lula (PT) pouco resta a fazer a não ser observar os danos e correr para apagar os incêndios.

Os fatos estão à mesa. A conceituada agência de classificação de risco S&P Global avaliou que o Brasil depende do compromisso do governo com uma agenda de reformas econômicas para chegar ao chamado “grau de investimento”, que sinaliza baixíssimo risco de calote da dívida nacional.

“A recuperação da classificação de grau de investimento pelo Brasil dependerá, em grande medida, do compromisso político com as reformas econômicas para alcançar uma melhor consolidação fiscal e crescimento econômico”, afirmou a agência, em evidente sinal de má vontade com o país, desprezando por completo o esforço de toda equipe econômica na aprovação de importantes medidas e na busca de um ajuste das contas públicas.

Igualmente setores da mídia criticam duramente a atual gestão. O chamado Lula 3 desagrada a muitos e nem mesmo os números relativamente bons da economia e da significativa melhora dos índices sociais são suficientes para mudar esse quadro. Não é preciso uma grande pesquisa para se constatar essa realidade. No dia a dia, editoriais e matérias das mais diversas atacam o governo e nem mesmo integrantes mais destacados do primeiro escalão, como o ministro da Fazenda, Fernando Haddad (PT/SP), escapam. Fogo pesado.

No Congresso Nacional o quadro é semelhante. Seguindo a política do “morde e assopra”, o presidente do Senado Federal, Rodrigo Pacheco (PSD/MG), criticou e deixou caducar parte da medida provisória que trata da desoneração da folha de pagamento dos municípios com até 156 mil habitantes. “Ela está errada desde o início”, afirmou, batendo de frente com Haddad. O ato retirou dos cofres do governo algo em torno de R$ 10 bilhões.

Até mesmo um problema específico, a crise da Enel em São Paulo, caiu na conta do Planalto. Nem a ênfase do ministro de Minas e Energia, Alexandre Silveira (PSD/MG) (aliado de Pacheco, por sinal), na defesa do governo federal melhorou o humor de todos. Culpa de Lula e companhia.

Desde o início do governo Lula, não houve um fato ou uma crise séria e verdadeira a ser enfrentada. Episódios muito isolados, numa clara tentativa de desestabilização e de instabilidade visando a quebra de confiança, pingaram aqui e ali. São “crises” fabricadas e sob encomenda, que em épocas outras, em outros governos, sequer seriam noticiadas, quando muito, não passariam de pequenas notinhas de final de página.

Importante dizer que a imprensa precisa e deve noticiar, fiscalizar e dar transparência a todos os atos do poder público. No entanto, o viés dado a muitos episódios, acaba colocando em xeque a credibilidade dessa cobertura.

Interesses de todos os tipos e forma fazem parte desse jogo, dessa queda de braço. Sempre foi assim e sempre será. No entanto, necessário dizer que há um trabalho sendo executado, de forma lenta, gradual, segura e consistente no sentido e com o objetivo de se criar uma crise de confiança, de desestabilização do atual governo.

Essa má vontade com a atual administração federal tem método e precisa alcançar os seus objetivos, afinal de contas, as eleições municipais estão aí e a sucessão presidencial, em 2026, não está muito distante. Esse governo precisa chegar, nesses dois pleitos eleitorais, enfraquecido, não importa como e nem as consequências. Simples assim.

Outro fator é que a diminuição do Estado brasileiro é condição inegociável e empresas públicas precisam ser vendidas à iniciativa privada. O Estado não pode gerir e nem gerar riquezas. Esse atributo é exclusivo do setor privado, a exemplo da Enel em São Paulo, já que “é só privatizar que melhora”.

Exemplos do que ocorre não faltam.

Recentes pesquisas de opinião apontaram uma queda na popularidade do governo e do presidente Lula. É possível afirmar que o resultado era mais do que esperado, afinal de contas, depois de algumas semanas insistindo no mesmo assunto e sempre de forma negativa, faz-se a pesquisa com perguntas a respeito do assunto que foi amplamente explorado. O resultado, por óbvio, só poderia ser um. Objetivo alcançado, segue-se para a outra pauta negativa, e assim por diante.

Outro exemplo é o ministro das Comunicações, Juscelino Filho (União Brasil/MA). Durante semanas no ano de 2023, foi alvo da imprensa nacional de todo tipo de especulação e denúncias. Foi mantido no cargo e, surpreendentemente, sumiu dos noticiários.

Alexandre Padilha (PT/SP), ministro das Relações Institucionais, também foi notícia por ser “incompetente” e não estar à altura do cargo aos olhos do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP/AL). Por um breve tempo, sumiu das capas de revista. Voltou, agora, por ter indicado aliados políticos a determinados cargos no Ministério da Saúde. A notícia foram as indicações. Nenhuma linha sobre qualquer tipo de irregularidade. A matéria serviu apenas para expor e gerar fato.

Outro, que gerava manchetes quase que diárias, foi o então ministro da Justiça, Flávio Dino. A “crise” na segurança pública nos Estados da Federação (responsabilidade dos governadores, diga-se) era culpa de Dino e do governo federal, de acordo com os jornais de plantão. Ao deixar o ministério para ocupar a vaga de ministro do STF, a “crise” e todos os problemas da segurança pública nacional simplesmente desapareceram dos jornais. Foi só o atual ministro Ricardo Lewandowski assumir o posto que os “problemas” viraram meras notas de rodapé.

Até mesmo a suspensão da distribuição de dividendos extraordinários da Petrobras virou uma “crise” amplamente explorada, com críticas de todo tipo ao governo por “especialistas” renomados nos mais diversos programas jornalísticos. O não pagamento desses dividendos extraordinários gerou, de acordo com a imprensa, uma crise de desconfiança sem precedentes por ter, o presidente Lula , interferido na governança da empresa, o que comprovadamente não ocorreu. Por conta disso, o mundo não investirá mais no Brasil, segundo divulgado.

Enfim, são demonstrações claras que um movimento orgânico, bem organizado e com método está em pleno funcionamento. Se não existe um escândalo, se não existe uma piora nos índices econômicos e sociais, fabriquemos uma "crise". Quem perde é o país, boicotado diuturnamente por interesses outros que não o bem-estar social.

A situação a curto e médio prazos é de agudizamento e de cerco ao governo. Denúncias contra os mais diversos membros do governo, de qualquer nível e escalão, deverão começar a “pipocar” na imprensa, porque a “crise” precisa entrar e se instalar no Palácio do Planalto. 2026 já começou.

André Pereira César

Cientista Político

Alvaro Maimoni

Consultor Jurídico

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