De volta para o futuro? - Economia - Hold

De volta para o futuro?

A terça-feira, segundo dia da semana de esforços concentrados na Câmara dos Deputados, evidenciou as dificuldades para se fazer avançar uma agenda econômica mais aprofundada. As negociações seguem seus cursos mas, agora, não se pode afirmar com toda a certeza que os esforços das lideranças governistas, e de Arthur Lira (PP/AL), surtirão efeito em todas as frentes. Há muito a ser feito.

No caso do projeto que retoma o voto de qualidade no Conselho Administrativo de Recursos Fiscais (CARF), o relatório do deputado Beto Pereira (PSDB/MS), aparentemente bem recebido em um primeiro momento, logo perdeu fôlego com a nota divulgada pela bancada ruralista, contra a posição favorável ao governo contida na proposta e desfavorável aos contribuintes. Sem o apoio desse segmento importante do Congresso Nacional, a matéria perdeu tração e, nesse exato momento, são necessárias novas rodadas de negociações. Aqui, a depender da evolução das conversas, o debate em torno da reforma tributária pode ser antecipado.

Já o novo arcabouço fiscal, para ir a voto, depende de uma questão regimental - a votação do projeto do CARF ou a retirada do regime de urgência do mesmo. As discussões também seguem e o relator, deputado Cláudio Cajado (PP/BA), não esconde sua insatisfação com as mudanças efetuadas pelo Senado Federal. Apesar disso, ele tem afirmado que acatará a decisão das lideranças partidárias.

Entre as alterações estão a exclusão da proposta do Fundeb, das despesas com ciência e tecnologia e do Fundo Constitucional do Distrito Federal, esse último objeto de forte pressão dos políticos da capital. Além disso, o crédito adicional de pouco mais de R$ 30 bilhões no orçamento, por meio da desistência do governo em mudar a correção da inflação da regra fiscal, também gera ruídos entre os deputados.

Por fim, a tão aguardada proposta de reforma tributária segue em discussão. Além dos governadores e dos prefeitos (em especial dos grandes e médios municípios), vieram a Brasília representantes dos mais diversos setores. Entre os mais insatisfeitos (ou desconfiados, a depender do ponto de vista), estão os serviços, o agronegócio e as associações ligadas aos supermercados. Todos com projeções ruins caso a proposta do relator, deputado Aguinaldo Ribeiro (PP/PB), seja aprovada nos termos em que se encontra.

Arthur Lira banca o jogo da agenda econômica com os objetivos de deixar um legado, aproximar-se do governo e, no limite, se blindar das crescentes investigações contra ele em curso. Já aliados do Planalto reclamam do pouco empenho do presidente Lula (PT) em torno da reforma tributária. Entramos na quarta-feira em um ambiente de incertezas.

Os mundos político e econômico parecem flertar com um roteiro similar ao do clássico “De volta para o futuro”. O desejo parece ser o de retornar a um passado nem tão distante e, então, (re)começar a construção de uma nação (no caso do filme, da vida do personagem Marty Mcfly), sempre de maneira atabalhoada. Aí, pode ser tarde demais. O que se requer é mais seriedade no debate.

PS. Para o governo, a boa notícia do dia foi a aprovação, pelo Senado Federal, dos nomes de Gabriel Galípolo e de Ailton Aquino para, respectivamente, as diretorias de Política Monetária e de Fiscalização do Banco Central. Sem maiores sustos, os dois foram bem em suas sabatinas e deverão assumir seus postos em breve. Galípolo, por sinal, é nome hoje forte para substituir Roberto Campos Neto quando esse deixar a presidência da instituição.

André Pereira César

Cientista Político

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