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Diário da transição: a trincheira do Alvorada

Quinta-feira, 15 de dezembro. Enquanto o presidente eleito Lula (PT) enfrenta grandes dificuldades para montar o futuro governo, o atual mandatário trabalha a seu modo para colocar-se como oposição de fato ao petista. Os recentes movimentos de Jair Bolsonaro (PL) e aliados no Alvorada indicam quais deverão ser as estratégias dos bolsonaristas para os próximos anos.

Em primeiro lugar, é necessário frisar que o comportamento de Bolsonaro é baseado em um cálculo político bastante preciso. Ao oscilar entre o silêncio absoluto e mensagens dúbias, ele mantém sua base mais fiel mobilizada. Nas redes sociais, os grupos mais radicais falam em “sinais” emitidos pelo atual presidente e seu entorno mais próximo, o que poderá gerar resultados concretos “nas próximas 72 horas”.

O que para alguns parece motivo de piada, para outros gera preocupação. Os episódios de violência registrados no início da semana em Brasília são a prova cabal de que os extremistas estão prontos a confrontar a ordem democrática, com o aval de Bolsonaro, do recém-eleito senador e vice-presidente da República Hamilton Mourão e de todos os demais aliados mais próximos e ideológicos. O mesmo vale para os acampamentos em frente aos quartéis e o fechamento de rodovias. Tudo orquestrado e milimetricamente pensado.

Nesse sentido, o Alvorada se transformou em autêntica trincheira do bolsonarismo. À frente do Palácio, manifestantes em defesa do atual mandatário gritam palavras de ordem enquanto recebem apoio (inclusive alimentação) patrocinados pela primeira-dama Michelle Bolsonaro. Dentro, figuras polêmicas como o blogueiro Oswaldo Eustáquio, investigado no inquérito das fake news, se escondem por temer a prisão.

A grande questão que se coloca aqui diz respeito ao futuro dessa mobilização. Bolsonaro deixará o Palácio em poucas semanas, cedendo espaço para o novo presidente. O que farão seus fiéis seguidores? Manterão a vigília e passarão a atacar diretamente Lula na saída do Palácio? E quanto aos “protegidos” dentro do Alvorada, ficarão expostos às intempéries e à lei?

Jair Bolsonaro, como se sabe, já montou um roteiro pós-presidência da República. Seu partido, o PL, assumiu o compromisso de alugar uma mansão na capital federal para o titular do Planalto morar e, mais ainda, se posicionar como autêntica oposição ao petista e ao novo governo. Além disso, advogados serão contratados para ajudar no trabalho de blindagem da família Bolsonaro.

O Alvorada, hoje, representa uma trincheira temporária do bolsonarista, com data para se deslocar. Essa mudança será um teste para o ainda presidente e seu grupo. Se conseguirem manter a mobilização, terão condições de se tornar de fato uma oposição feroz e barulhenta contra a futura administração. As respostas serão conhecidas muito em breve.

André Pereira César
Cientista Político

Colaboração: Alvaro Maimoni – Consultor Jurídico

PS. O voto da presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministra Rosa Weber, defendendo a derrubada do orçamento secreto, coloca em xeque a PEC do Bolsa Família. A reação do Centrão será crucial para os rumos da matéria na Câmara dos Deputados.

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