Governo em construção: oposição - Hold Assessoria

Governo em construção: oposição

Capítulo nº 4

Enquanto o presidente eleito Jair Bolsonaro negocia a formação de sua base aliada, os partidos de oposição enfrentam dificuldades para estabelecer uma agenda unificada para se opor ao novo governo. O PT e as demais agremiações de centro-esquerda divergem nas estratégias a serem adotadas a partir de agora.

Sem esse entendimento entre as partes, não haverá uma oposição única a Bolsonaro, mas oposições, no plural. Esse fato pode ser útil ao presidente eleito, que certamente saberá explorar a falta de coesão dos adversários.

A divisão começou a ganhar contornos mais concretos no segundo turno da disputa presidencial. O "apoio crítico" do neopedetista Ciro Gomes a Fernando Haddad (PT) deixava claro que a música tocada não era a mesma entre eles. Agora, Gomes já discute com Marina Silva (Rede) a formação de um pólo de "oposição democrática", que defenderá as instituições, os interesses nacionais e as populações mais vulneráveis. Outros grupos e partidos políticos poderão aderir ao movimento que nasce. Não o PT, porém.

Antes da reunião entre Gomes e Marina, lideranças do PDT, do PSB e do PCdoB já haviam se encontrado para discutir a formação de um bloco oposicionista na Câmara dos Deputados. Esse bloco, que exclui o PT, seria composto por 69 deputados das três agremiações. Dois pontos precisam ser aqui ressaltados - o bloco, caso confirmado, coloca em xeque o hegemonismo petista junto à esquerda na Câmara e terá impacto no processo de distribuição de vagas na Mesa Diretora e nas comissões da Casa.

O PSOL, por seu turno, deverá caminhar sozinho na oposição, sem se unir a blocos. Essa é uma prática histórica do partido, que elegeu dez deputados federais, maior bancada eleita na sua breve história.

E o PT, quais caminhos deverá adotar, visto que apesar de ser a maior bancada, com 57 deputados, nitidamente perde força no campo da esquerda? A exemplo do PSDB, os petistas precisarão fazer uma profunda revisão interna, discutindo práticas e programas. O partido, que sempre foi a maior referência da esquerda brasileira a partir da redemocratização, precisará criar, ao longo da próxima legislatura, novas lideranças e uma agenda mais condizente com os dias que correm.

Num primeiro momento, para não ser isolado a partir de 2019, precisará contar com a fundamental atuação de alguns expoentes. Nomes como Jacques Wagner (Senado) e Arlindo Chinaglia (Câmara), ambos com larga experiência e bom trânsito em todos os partidos, precisarão ir a campo. Elevar o nível do debate. Ser moderado nas negociações. Dar voz de comando para as bancadas da Câmara e do Senado. Ser oposição propositiva e não apenas reativa. Dar espaço para novas lideranças. São alguns fatores que, em tese, poderão colocar o PT de volta ao núcleo do debate. Do contrário, os petistas serão meros figurantes no novo tabuleiro da política brasileira.

Em suma, a esquerda de um modo geral parece viver um momento de reorganização de suas forças. Essa nova ordem terá grande importância para a política brasileira nos próximos anos. O governo Bolsonaro será seu primeiro grande teste.

André Pereira César
Cientista Político

Texto publicado originalmente em 08/11/2018.

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