Gera um misto de incômodo com apreensão a constatação de que a maior potência do planeta atravessa uma séria crise de comando que, a depender dos resultados, poderá se perpetuar ao longo dos anos. Tanto o atual presidente, o democrata Joe Biden, quanto seu adversário, o ex-presidente republicano Donald Trump, não têm os requisitos mínimos para ocupar o cargo. O debate da noite de quinta-feira, 27 de junho, explicitou de maneira crua essa impactante realidade.
O embate foi duro e revelou as limitações dos dois candidatos. Agressividade e troca de ofensas deram o tom do evento. No limite, Trump mostrou o mesmo de sempre - atacando e mentindo - enquanto Biden mostrou dificuldades em desenvolver linhas de raciocínio que possibilitassem sequer defender suas propostas. Terrível.
Questões graves emergem do quadro atual. A mais relevante - os democratas poderiam trabalhar em tempo hábil um nome alternativo para concorrer no lugar do atual presidente, que não conseguiu rebater as mentiras de Trump?
Há, nesse exato momento, um debate interno no partido Democrata justamente para se discutir uma possível mudança de candidato. Seria inédito e que mostraria a fragilidade da legenda - e do sistema partidário e eleitoral norte-americano como um todo.
O pleito norte-americano, ao que tudo indica, replica uma realidade global. A polarização está presente e o debate efetivo e real em torno dos grandes temas perde espaço para questões menores - vale mais vender um produto como um iogurte ou um sabonete do que discutir questões reais, como economia, guerras ou problemas sociais.
A pobreza do debate eleitoral dos Estados Unidos pode ser resumida nas palavras do jornalista Thomas Friedman, do New York Times. Em suas palavras, “Assisti ao debate Biden-Trump sozinho em um quarto de hotel em Lisboa, e isso me fez chorar. Não consigo me lembrar de um momento mais doloroso na política de campanha presidencial americana em minha vida — precisamente por causa do que ele revelou: Joe Biden, um bom homem e um bom presidente, não tem nada a ver com concorrer à reeleição. E Donald Trump, um homem malicioso e um presidente mesquinho, não aprendeu nada e não esqueceu nada.”
Biden segue? Hoje, pouco provável. Trump ganha? Hoje, uma realidade palpável. O fato é que a propalada democracia americana, tal qual a conhecemos, não é a mesma. Michele Obama vem aí?
André Pereira César
Cientista político