A coalizão que integra o governo Lula (PT) passa por momentos de turbulência. Há clara dissonância no primeiro escalão, e o próprio titular do Planalto mostra-se desconfortável com algumas situações. Dado o atual quadro, mudanças na Esplanada não surpreenderão - provavelmente após as eleições municipais.
Os fatos são evidentes. Chama a atenção a relação dos ministros da Fazenda, Fernando Haddad (SP), e da Casa Civil, Ruy Costa (BA) - ambos petistas, diga-se. A MP que restringia o uso de créditos tributários do PIS/Cofins acirrou a animosidade que marca o dia a dia entre os dois. Aliados de ambos trocam acusações sobre a responsabilidade pela crise que, na semana passada, culminou com a devolução do texto, fragilizando (em termos) a imagem do comandante da equipe econômica. Lembremos que Costa foi um dos responsáveis pela queda de Jean Paul Prates (PT/RN), aliado de Haddad, da presidência da Petrobras.
Essa situação traz à memória o primeiro mandato de Fernando Henrique Cardoso, nos já longínquos anos noventa. O fiscalista Pedro Malan, da Fazenda, se desentendia com frequência com o comandante do Planejamento, José Serra (PSDB/SP), de perfil desenvolvimentista. Batidas de cabeça eram constantes no período, e o então presidente da República precisou usar sua habilidade política para baixar a fervura.
Voltando ao governo Lula 3.0, o ministro das Comunicações, Juscelino Filho, do neoaliado União Brasil, tornou-se um problema permanente. Após uma série de denúncias, ele foi indiciado pela Polícia Federal em uma investigação sobre suposto desvio de recursos de emendas parlamentares. Agora, seu partido decidiu manter seu apoio ao correligionário. Pior para Lula, que não pode se indispôr com o padrinho do ministro, o senador Davi Alcolumbre (União Brasil/AP), o mais forte candidato à presidência da Câmara Alta em 2025. O que fazer nesse caso?
Mesmo o presidente da República tem problemas que o envolvem diretamente. Mais uma vez, o foco da questão é o Banco Central, em especial na figura de Roberto Campos Neto. Em entrevista concedida na terça-feira, 18 de junho, Lula criticou duramente o presidente da instituição, afirmando que o mesmo “tem lado político e prejudica o país”. A declaração de Lula vem após uma entrevista de Campos Neto ao jornal Folha de São Paulo, onde elogia o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos/SP), e se coloca como eventual candidato à cadeira de ministro da Fazenda num futuro governo de Tarcísio. Está claro que o petista trabalha para forçar a renúncia do presidente do BC que deverá deixar o cargo no final do ano.
O fato é um só. Ao assumir pessoalmente a articulação política de seu governo, Lula em algum momento, muito em breve, precisará desatar os nós e superar os obstáculos se quiser chegar forte à disputa para reeleição.
Enfim, governos de coalizão podem sofrer com seus próprios gigantismos. O caso da atual gestão mostra isso. Sem uma mínima capacidade de articulação interna, tudo fica ameaçado. A pergunta segue a mesma, já colocada nesse espaço em tempos recentes - como colocar à mesma mesa o PSOL, o União Brasil e o PP?
André Pereira César
Cientista Político


