A situação ficou insustentável e algum tipo de reação se tornou inevitável. Na Câmara dos Deputados, o crescente ambiente de conflagração entre grupos adversários, que passam da agressão verbal para o confronto físico, levou lideranças partidárias a buscar o presidente da Casa, Arthur Lira (PP/AL), em busca de soluções. Haverá saída?
Para rememorar, o ápice desse quadro ocorreu na última semana quando, em duas comissões, o caos tomou conta. Primeiro, no Conselho de Ética, durante o julgamento do pedido de cassação do mandato do deputado André Janones (Avante/MG) por suposta prática de “rachadinha”, um grupo de cerca de dez deputados (todos do PL, ligados ao bolsonarismo) tumultuou a sessão e, com o arquivamento do processo, tudo descambou para o pugilato. Cenas lamentáveis.
A seguir, o mesmo grupo se encaminhou para a Comissão de Direitos Humanos e, quando ocorriam os debates em torno de um projeto de lei, repetiram a ação. Pior, a decana deputada Luiza Erundina (PSOL/SP), atacada, passou mal e acabou internada em uma UTI. Por pouco não ocorreu uma tragédia.
Cabe aqui observar que há um claro modus operandi por parte desse grupo de deputados. Eles são novatos na Câmara, pertencem ao que se pode chamar de ultradireita e rejeitam qualquer debate, preferindo apenas repetir os mantras “comunista”, “terrorista”, entre outros, e registrar tudo nas redes sociais, para o júbilo de seus seguidores e apoiadores. A política TikTok colocada em prática. São os mesmos que ocupam, em bando, a tribuna do Plenário quando um dos seus discursa.
No caso, as lideranças partidárias buscam conter esse pequeno, mas barulhento e agressivo grupo de parlamentares. O movimento une representantes de um amplo leque de agremiações, do PP ao PCdoB. Mesmo o Planalto manifesta preocupação com o quadro. Mas quais as armas que o presidente Lira tem em mãos?
A princípio, estuda-se a possibilidade de se alterar o Regimento Interno da Casa, para impor maior rigor durante as sessões, tanto em Plenário quanto nas comissões. O conceito de decoro parlamentar, afinal, precisa ser efetivamente respeitado. E as punições precisam ser reais, não meros “puxões de orelha” como ocorre hoje.
Lira, na verdade, tem limitações para agir, ao menos nas condições atuais. Em Plenário o controle realmente é todo dele - o instrumental para agir com rigor está em suas mãos, o que nem sempre ocorre, diga-se. Nas comissões, porém, a história é outra. Nesse caso, é preciso que os líderes atuem com mão de ferro sobre suas bancadas, e os presidentes dos colegiados igualmente tenham pulso firme. Uma ação coletiva da parte de quem detém algum comando.
Outro fator que ajuda a agravar os ânimos tem sido a reiterada agressão de deputados por assessores parlamentares. Em tempos idos, a assessoria limitava-se a assessorar seu parlamentar ou bancada. Hoje, com a “porteira” aberta, esses técnicos sentem-se livres para também se manifestar, como se igual fossem em direitos e obrigações. Goste-se ou não do espectro político do outro parlamentar, naquele local de trabalho, somente os “eleitos” é que podem, por determinação regimental e legal, se pronunciar e os seus posicionamentos devem ser combatidos no campo da política e das ideias por seus iguais. As assessorias devem assessorar e nada mais. Lira e as lideranças terão que encarar mais essa frente de batalha.
Enfim, ou se corrige o rumo com urgência ou o Congresso Nacional se transformará em uma praça de guerra. Não há meio termo para a frágil (e hoje envergonhada) democracia. Ou se retoma a normalidade ou as instituições seguirão sob permanente ameaça.
André Pereira César
Cientista Político
Colaboração: Alvaro Maimoni - Consultor Jurídico