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Um Brasil conflagrado

Depois dos acontecimentos do último domingo, 31 de maio, em São Paulo e no Rio de Janeiro, manifestações contra o governo do presidente Jair Bolsonaro vêm ocorrendo em outras capitais brasileiras a exemplo de Manaus e Curitiba. Os protestos nos Estados Unidos, por conta do assassinato de George Floyd por um policial branco, inflamaram o mundo ocidental e talvez tenha contribuído para que os manifestantes brasileiros fossem às ruas fazer frente às semanais manifestações dos apoiadores do governo.

Dentre os gritos de ordem e da mistura de pautas dos que são contra o governo, uma se destaca, e onde todos convergem: a defesa da democracia.

Após o Supremo Tribunal Federal ter retirado o sigilo do vídeo da reunião ministerial do dia 22 de abril, os ânimos definitivamente se acirraram. O STF, na legítima defesa da institucionalidade, em decorrência de decisões proferidas principalmente no inquérito das fake news, acabou ajudando a manter a chama da polarização acessa. Mas, uma decisão em particular, do ministro Celso de Mello, piorou o quadro político.

Em decorrência do pedido de busca e apreensão do celular de Bolsonaro, do seu filho Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ), do ex-diretor-geral da PF Maurício Valeixo, de Sérgio Moro e da deputada federal Carla Zambelli (PSL/SP), formulado por parlamentares da oposição, visando a coleta de provas da suposta interferência do presidente na Polícia Federal e do consequente envio, pelo decano do STF, para o Procurador da República, Augusto Aras, se manifestar, o ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República, Augusto Heleno, emitiu à Nação brasileira dura nota. Disse não aceitar a apreensão do celular do presidente alertando que se fosse efetivada essa apreensão, a harmonia entre os Poderes estaria comprometida o que poderia acarretar consequências imprevisíveis para a estabilidade nacional.

A nota oficial do ministro Augusto Heleno, em tom de ameaça diga-se, posteriormente endossada pelo ministro da Defesa, General Fernando Azevedo e Silva, gerou desconforto e manifestações contrárias dos outros Poderes e de uma grande parcela da sociedade organizada, por trazer nas entrelinhas, a real possibilidade de uma intervenção militar.

O Procurador acabou por não endossar o pedido e o ministro Celso de Mello rejeitou esta semana a solicitação de apreensão. Mas o estrago foi feito.

O país chegou ao ponto de não retorno.

As últimas pesquisas demonstram a piora na avaliação do governo sob todos os aspectos. Como consequência, o discurso mudou. O presidente voltou a atacar a imprensa, o STF e o Congresso Nacional. Seus apoiadores, na sua grande maioria, ficaram ainda mais intransigentes e agressivos com aqueles que fazem oposição às pautas de Bolsonaro.

As manifestações em São Paulo e no Rio de Janeiro, no último final-de-semana, contra o governo de Jair Bolsonaro e seus apoiadores, promovida pelas torcidas do Corinthians, São Paulo, Palmeiras, Santos e Flamengo, foi o sinal que muitos esperavam para saírem às ruas.

Não há mais volta. Nas palavras do próprio presidente, não há mais diálogo. Acabou porra! Novas manifestações estão agendadas e deverão ocorrer nos próximos dias. Movimentos como o #somos70%, Estamos Juntos, Basta! e muitos outros ganharam corpo e forma nas redes sociais, o que deve impactar no aumento de participantes nessas manifestações de rua contra o governo.

Da mesma forma, o governo e seus apoiadores também estão se movimentando para defenderem as suas pautas. Bolsonaro, na fatídica reunião do dia 22 de abril, afirmou em alto e bom som, que se for para cair, que seja lutando. A disputa pelo poder, nas ruas, está apenas começando.

Por fim, há um sentimento, uma insatisfação geral quanto às questões sociais, econômicas e política. Os eventos nos EUA são uma espécie de catarse que atingiu em cheio o Brasil. Não fosse essa pandemia, as ruas do país certamente já estariam tomadas, diariamente, por ambos os lados.

O Brasil conflagrou.

Em tempos de pandemia, da iminente crise econômica e social que bate à porta, o que mais precisamos nesse momento, é de tranquilidade para podermos navegar por esses mares revoltos, mas, o que nos está sendo entregue, por nossos timoneiros, são apenas incertezas quanto ao futuro.

Alvaro Maimoni

Consultor Jurídico

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