Foto de Ricardo Stuckert
Muito barulho por nada. O título da peça de Shakespeare resume à perfeição o domingo de manifestações pelo Brasil. Ao contrário do que se temia, os atos a favor e principalmente os que foram contra o governo Bolsonaro transcorreram em um clima de tranquilidade.
É importante que se apontem alguns elementos das manifestações. Em primeiro lugar, o contingente contra o governo foi significativamente maior do que o dos defensores do presidente. Esse fato indica que os grupos organizados de oposição poderão ganhar mais espaço a partir de agora, ainda mais porque foram pacíficas e com pautas definidas.
Além disso, os manifestantes contrários ao titular do Planalto receberam adesões relevantes, em especial dos profissionais de saúde, artistas e do movimento negro - esse último em função dos protestos que vem ocorrendo nos Estados Unidos após o assassinato de George Floyd e das recentes mortes do menino Miguel Otávio Santana, em Recife, e do adolescente João Pedro, no Rio de Janeiro.
Mesmo em São Paulo não foram registrados maiores problemas. Talvez a grande questão tenha sido o rompimento do isolamento social em plena quarentena. Já a agenda na capital paulista dos apoiadores de Bolsonaro seguiu o velho script, com pedidos de fechamento do Supremo Tribunal Federal e o impeachment do governador João Dória (PSDB).
O presidente Jair Bolsonaro, por sua vez, mudou seu modo de agir. Ao contrário do que ocorreu em manifestações recentes, dessa vez ele teve comportamento discreto e evitou se aproximar das aglomerações em frente ao Planalto. Preferiu conversar com um pequeno grupo no cercadinho do Palácio da Alvorada.
O discurso do presidente Jair Bolsonaro, de alguns de seus ministros e de apoiadores mais próximos, de que as manifestações contrárias ao seu governo seriam realizadas por “marginais, viciados e idiotas” e que serviriam apenas para promover tumulto e o confronto, caiu por terra. A construção da narrativa difundida por Bolsonaro, de que seriam movimentos violentos, não se confirmou. Apesar das ameaças veladas de violenta repressão policial, inclusive com o uso da Força Nacional, o que se viu no último domingo foram atos em defesa da democracia e contra o racismo, de forma pacífica e organizada.
Assessores mais próximos ao Planalto temem o aumento dessas manifestações, ainda mais se vierem a se tornar atos pró-impeachment e, principalmente, se passarem a ser ouvidos pelo Congresso Nacional.
A base governista montada às pressas com a entrega de cargos a determinados parlamentares do Centrão, não é orgânica e, como a história já demonstrou, é suscetível aos apelos populares e aos seus próprios interesses. A hora que a fonte de recursos secar, aliada ao aumento da insatisfação popular, Bolsonaro provavelmente será abandonado à própria sorte.
Enfim, pode-se afirmar que os eventos de domingo foram anticlimáticos. Ao final, apenas um dos lados pôde cantar vitória mesmo num jogo de poucas emoções.
André Pereira César
Cientista Político