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O curto prazo de Bolsonaro

Os eventos se sucedem em uma velocidade difícil de acompanhar. Para citar apenas alguns dos mais relevantes, o novo ministro da Saúde, Marcelo Queiroga, assume em pleno pico de óbitos decorrentes da pandemia; o ex-presidente Lula entra no jogo sucessório; o novo auxílio emergencial será menor que o de 2020, e só começará a chegar aos que dele necessitam em abril; a inflação mostra sinais de vida; e a demora na aprovação do orçamento de 2021 deixa o governo sem recursos para pagar os servidores já no próximo mês.

Esse quadro inevitavelmente aumenta a pressão sobre o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). Agora, ele precisa dar respostas a curto prazo, sob risco de continuar a perder apoio político.

O caso do novo ministro sintetiza à perfeição o atual momento. A princípio, o cardiologista Queiroga não era a primeira opção. O neoaliado Centrão apoiava o deputado Dr. Luizinho (PP/RJ), ligado ao presidente da Câmara, Arthur Lira (PP/AL). A inabilidade política do titular do Planalto e de seu entorno levaram à escolha do médico, desagradando profundamente os deputados. Para piorar, a também cardiologista Ludhmila Hajjar, igualmente cotada para o cargo, abriu o jogo para a imprensa após conversar com Bolsonaro. Seu depoimento revelou um cenário caótico na Saúde.

O “efeito Lula” já se faz sentir no governo e na oposição, e as pesquisas já mostram que o ex-presidente seria hoje um candidato competitivo. O Planalto ainda não assimilou o fato e muito menos conseguiu esboçar alguma reação. Bolsonaro ficou zonzo nas cordas.

O novo auxílio emergencial, além de demorar a chegar às famílias, poderá ser fonte de frustração. O total de pessoas que receberão o benefício será menor, assim como o valor. Com pouco dinheiro em caixa, o governo jogou com a realidade. Some-se a isso a inflação, em especial dos alimentos, que atinge especialmente as classes mais baixas. Assim, é praticamente inevitável que o Copom eleve a taxa de juros (Selic) nessa quarta-feira, 17 de março, o que não ocorre há tempos.

O atraso na votação do orçamento de 2021 já ameaça o salário dos servidores. Além disso, os ministérios estão sem recursos para investir e pressionam o Congresso Nacional para elevar suas verbas por meio de emendas parlamentares. A não votação da lei orçamentária até agora é mais uma prova da baixa capacidade de articulação política do governo.

A essas questões abordadas acima se somam outras, como a posição de governadores e prefeitos contra a ação do Planalto no combate à pandemia, a investigação do imóvel adquirido pelo senador Flávio Bolsonaro (Republicanos/RJ) em Brasília e a insatisfação das polícias com o Planalto por se sentirem traídas no processo de votação da PEC Emergencial. O cardápio é extenso.

Por fim, os números não mentem. Pesquisa DataFolha realizada em 15 e 16 de março indica a corrosão da popularidade do presidente. De acordo com o levantamento, 44% dos brasileiros consideram o governo “ruim ou péssimo” (eram 40% em janeiro), contra 30% que avaliam como “bom ou ótimo” (31% em janeiro). O drama aumenta quando se aborda somente a gestão da pandemia - 54% consideram a atuação “ruim ou péssima”, contra 22% de “bom ou ótimo”. A crise da COVID-19 representa talvez o maior obstáculo às pretensões eleitorais de Bolsonaro.

Arma-se uma tempestade perfeita no horizonte. Com poucos recursos em caixa, o governo está praticamente amarrado. O curto prazo pode ser cruel com Bolsonaro.

André Pereira César
Cientista Político

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