À procura de um governo - Hold

À procura de um governo

O mês de março já começou e não há qualquer sinal de soluções para a crise em curso. Ao contrário, a cada semana que passa novos elementos se somam ao já conturbado ambiente, tornando ainda mais dramático o quadro político, econômico e social do Brasil. O governo federal, de quem se espera medidas eficazes, não se mostra capaz de agir para ao menos minimizar a crise. Os eventos dos últimos dias reforçam essa percepção.

Para começar, a presidente Dilma está perdendo sua principal base de sustentação, o PT. Boa parte da agremiação não aceita as medidas sugeridas pela presidente, como a reforma da Previdência, e avalia que ela se distanciou das plataformas históricas do petismo. Sua ausência na festa de comemoração dos 36 anos de fundação do partido simboliza esse mal estar e, por mais que as partes minimizem o fato, o ambiente é muito ruim.

A mudança no comando do ministério da Justiça gerou insatisfação entre setores do PT, de aliados e da Polícia Federal. Os petistas e alguns aliados reclamam de não haver sido consultados na indicação de Wellington César, que é muito próximo do ministro Jaques Wagner, para substituir José Eduardo Cardozo. Na Polícia Federal, a sensação corrente é a de que o novo ministro da Justiça tentará, de algum modo, controlar a Operação Lava Jato. Comenta-se, por sinal, que o ex-ministro Cardozo não resistiu à pressão de Lula, que o criticava por “deixar a PF agir livremente”.

No âmbito da Lava Jato, a pressão sobre o governo só aumenta. Vários executivos de empreiteiras, entre elas OAS, Andrade Gutierrez e Odebrecht, iniciaram o processo de delações premiadas, e delas esperam-se novas informações capazes de comprometer até mesmo o Planalto. Mas a principal delação, anunciada na manhã de quinta-feira, partiu do senador licenciado Delcídio do Amaral (PT/MS). De acordo com a imprensa, o ex-líder do governo no Senado teria afirmado que a presidente Dilma teria trabalhado para controlar a Lava Jato. Ela, por exemplo, teria nomeado para o Superior Tribunal de Justiça (STJ) ministros favoráveis às teses de defesa das empreiteiras. O ex-presidente Lula, por sua vez, teria participado das conversas para que o ex-diretor da Petrobras, Nestor Cerveró, deixasse o país.

Claro está que as denúncias de Delcídio do Amaral precisam ser comprovadas, mas um fato é inegável – as novas informações fragilizam ainda mais o Planalto e podem ter consequências imprevisíveis a curto prazo. Pode-se afirmar que o governo Dilma enfrenta sua maior crise.

            Também no Congresso Nacional o governo expõe suas fragilidades. A aprovação, no Senado, do projeto do senador José Serra (PSDB/SP) que retira a obrigação da Petrobras de ser a operadora exclusiva em todos os campos do pré-sal e de arcar, simultaneamente, com 30% de todos os investimentos, é um exemplo claro dessa fragilidade. O presidente da Casa, senador Renan Calheiros (PMDB/AL), aproveitou o momento para sinalizar que apreciará uma “agenda própria”, com todos os riscos que isso implica para o Planalto.

            Não bastasse o agravamento do quadro político, a economia também apresentou números muito ruins. O IBGE divulgou o resultado do PIB de 2015 e a notícia não poderia ter sido pior – queda de 3,8%, a maior desde 1990 (-4,3%), ano em que Fernando Collor de Mello confiscou a poupança. Diante desse quadro, as medidas sinalizadas pelo governo, como a reforma da Previdência e a volta da CPMF, parecem inócuas. O péssimo resultado do PIB reforçará o discurso da oposição de que a política econômica do governo fracassou.

            Nem mesmo as recentes derrotas sofridas pelo presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB/RJ), amenizam a situação do governo. O Conselho de Ética da Casa decidiu dar sequência ao processo de investigação de Cunha e o plenário do Supremo Tribunal Federal tornou o parlamentar fluminense réu na Lava Jato. O deputado, porém, esgotará os meios para se defender e, com seus aliados, protelará ao máximo o processo que corre na Câmara. Ao governo será necessária atenção redobrada, pois Cunha certamente colocará em votação proposições da chamada “pauta bomba” e trabalhará para fazer avançar o processo de impeachment da presidente Dilma.

Em 1921, o teatrólogo italiano Luigi Pirandello publicou Seis personagens à procura de um autor, uma de suas principais peças. Na obra, um grupo de personagens rejeitadas por seu autor invade um ensaio e tenta convencer o diretor a encenar suas vidas. Essa imagem serve como metáfora da conjuntura nacional – o autor é o governo, que não consegue trabalhar com o grupo de personagens que o pressiona. Esse grupo de personagens representaria a sociedade civil, os trabalhadores, os empresários, os investidores, entre outros, que tentam ajudar na busca por soluções para a atual crise.

Na peça de Pirandello, os personagens atingem seu objetivo, ao final. Na cena brasileira, a situação é mais dramática. Seguimos à procura de um governo.

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